Zero Lactose: O mínimo que você precisa saber.

Os produtos Zero lactose invadiram as prateleiras dos mercados nesta última década. Assim como qualquer novidade, essa também veio acompanhada de uma enxurrada de informações, algumas delas desencontradas. Nesta série de artigos nós vamos colocar os pingos nos “is” e tirar as principais dúvidas em relação aos produtos Zero Lactose.

Neste primeiro artigo da série, vou abordar a intolerância a lactose e o desenvolvimento da tecnologia dos produtos hidrolisados.

Boa leitura!

Zero Lactose
Representação para a hidrólise da lactose.

Lactose, Hidrólise. O que é isso?

A lactose é o açúcar do leite. Não apenas do leite de vaca, mas de todos os leites. Lê-se leite como a secreção vinda das glândulas mamárias das espécies de mamíferos, incluindo nós humanos.

Ela tem importância vital na formação do sistema nervoso central, na absorção de nutrientes e na regulagem da flora intestinal do recém-nascido, além de ser fonte de energia.

Quimicamente falando, a lactose é um dissacarídeo. Uma molécula composta de dois monossacarídeos unidos por uma ligação glicosídica. Esses monossacarídeos são a glicose e a galactose.

LACTOSE
Molécula de lactose

Mesmo depois de adultos, a lactose constitui uma boa fonte de energia na alimentação. Acontece que ela não é absorvida pelo nosso organismo em sua forma nativa. A lactose precisa ser metabolizada, quebrada em partes menores.

Entram em cena as enzimas. São elas as responsáveis por esta quebra. A betagalactosidade, ou simplesmente lactase, é a enzima que quebra a ligação glicosídica, separando glicose e galactose. Esta quebra da ligação recebe o nome de hidrólise enzimática.

Uma vez separados, estes açúcares cumprirão sua função no organismo.

Ou seja, a hidrólise da lactose é um processo natural que ocorre em nosso corpo.

Intolerância à lactose.

Contudo, nem todas as pessoas conseguem produzir a enzima lactase. Durante a vida, estas pessoas deixam de sintetizar a enzima, gerando uma deficiência na absorção da lactose.

Alguns bebês inclusive nascem com essa deficiência no metabolismo pela falta da enzima. Mas estes casos são extremamente raros. O mais comum é ir perdendo a capacidade de digestão da lactose ao longo dos anos.

Mas qual o problema de não conseguir digerir a lactose?

Ocorre que essa lactose ainda será metabolizada dentro do nosso corpo, mas não pelo nosso sistema, infelizmente. Os microrganismos presentes no intestino vão fermentar a lactose, gerando como produtos gases e ácido.

Como resultado do acumulo destes produtos, temos dores abdominais, cólicas, diarreia e mal estar, além de outros sintomas gastrointestinais.

Dizemos então que a pessoa com esta condição é intolerante à lactose, ou seja, não é capaz de digerir este açúcar.

Existem graus de intolerância. Isto porque o nosso corpo não para de produzir a enzima de um dia para o outro. É um processo gradativo.

Pessoas que produzem a enzima, mas em pouca quantidade, terão sintomas mais leves. Por outro lado, pessoas com ausência total de lactase terão sintomas mais severos.

Incomodos intolerancia a lactose zero lactose
“Vish! Será que foi o queijo?”

Estima-se que 70% da população mundial seja intolerante à lactose em algum grau. No Brasil, estes números chegam 40%.

A solução para os intolerantes.

Um vez que a lactose é um dos constituintes principais do leite (Inclusive o de maior quantidade depois da água), a intolerância leva as pessoas que a possuem a evitar o consumo de lácteos.

Isto não só tem consequências de mercado como também biológicas.

O leite é uma das principais fontes de cálcio para o ser humano, além de outros nutrientes. Deixar de consumir leite e derivados pode acarretar uma série de outros problemas.

Neste contexto, existia um grande interesse em solucionar esta questão.

“Se o problema é quebrar a lactose no organismo, porque não quebramos ela antes do consumo?”.

Foi pensando assim que Virginia Holsinger pesquisou e desenvolveu o primeiro leite Zero lactose. Isso foi possível inserindo uma enzima lactase diretamente no leite. Esta enzima foi produzida a partir de microrganismos, mais precisamente fungos e leveduras.

Importante deixar claro que a enzima é purificada antes de sua utilização. Não são colocados microrganismos no leite para que ocorra a hidrólise.

Desta forma, o leite já chega com a lactose quebrada no organismo, permitindo sua absorção sem os problemas citados acima.

Aspectos tecnológicos gerais

40 anos depois, estes processos já estão bem estabelecidos nas indústrias. A hidrólise no leite pode ser realizada adicionando a enzima lactase antes, durante ou mesmo após o processamento, como é o caso dos sistemas FlexDOS.

As enzimas possuem atividade dependente da temperatura, assim como os microrganismos de origem. À temperaturas mais baixas sua atividade é reduzida. Geralmente as lactases microbianas tem sua atividade máxima em temperaturas mesófilas (Entre 37 e 42°C).

Isso significa na prática que um processo de hidrólise à frio pode durar entre 20 e 30 horas, enquanto um processo à quente dura de 2 a 4 horas. Este tempo é necessário para a quebra total do açúcar presente no leite, para garantir que pessoas intolerantes não tenham prejuízos no consumo.

Embora pareça sempre mais vantajoso usar a hidrólise mais rápida, seu uso é bem restrito na indústria. Acontece que a temperatura ótima da enzima é também a temperatura ótima dos microrganismos. Manter o leite nesta temperatura por algumas horas é o suficiente para perda de qualidade e deterioração.

Por se tratar de uma proteína, a lactase também esta sujeita à desnaturação em altas temperaturas (Acima dos 60°C). Dessa maneira, a melhor forma de manter sua atividade é estocando em ambiente refrigerado. Bem como deve se prestar atenção para não aplicá-la logo antes de um tratamento térmico.

A produção Zero Lactose.

Apesar de a hidrólise não levar a alterações nutricionais no leite, existem alguns pontos importantes que alteram as tecnologias de produção de alguns derivados.

E é sobre isso que vamos falar nos próximos artigos desta série.

Vou passear por cada um dos derivados do leite, explicando que modificações são estas e como contorná-las.

E você que não é da indústria de lácteos, mas usa algum produto a base de leite em suas formulações, continue acompanhando. Ao final desta série teremos também um artigo sobre os impactos dos produtos Zero lactose em outras indústrias de alimentos.

Paulo Henrique Rodrigues Júnior
Paulo Henrique Rodrigues Júnior

Mestre em Ciência e Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal de Viçosa. Atuo no setor de P&D e Processos na indústria desde 2015.
E desde então vivo um caso de amor pelos Processos Industriais. E quando sobra um tempinho, faço uns desenhos.

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