Eu já perdi as contas de quantas vezes eu falei sobre PDCA no meu Instagram. É um conceito que eu tento usar pra tudo. Mas aqui no blog eu o citei apenas uma vez, neste artigo aqui. Chegou a hora de escrever sobre essa ferramenta e mostrar o quão poderosa ela é para o profissional indústria de alimentos.
Não é difícil definir ou entender o que é o ciclo PDCA. Nas disciplinas ou cursos de gestão da qualidade essa é uma das primeiras ferramentas apresentadas. E sua pesquisa por esse tema no Google deve ter encontrado vários outros artigos trazendo uma definição.
Definir é importante e vamos fazer aqui, como sempre faço. Mas antes quero tirar essa marca do PDCA ser uma “ferramenta de gestão de qualidade”. O PDCA é uma ferramenta para qualquer setor justamente porque é uma ferramenta para alcançar a qualidade. A qualidade não é um setor ou uma área, ela é intrínseca à toda atividade dentro da indústria.
Podemos e devemos aplicar o PDCA ao Planejamento e Controle de Produção (PCP), por exemplo. Manutenção, treinamentos e gestão de pessoas, ambiental, contabilidade, P&D, projetos, etc. Onde existir um processo, o PDCA pode ser aplicado.
Dito isso, vamos ao conceito?
O ciclo de Deming?
Talvez você conheça essa ferramenta pelo nome de “Ciclo de Deming”. Isso porque ela foi difundida por William Edwards Deming em meados da década de 50. Professor de matemática e estatística, Deming contribuiu muito no campo da administração e controle de qualidade, sendo um dos pilares do modelo de gestão de qualidade japonês.
Contudo, não foi Deming quem idealizou o ciclo. Ele foi proposto trinta anos antes por Walter Andrew Shewhart, físico e estatístico conhecido como o “pai” do Controle estatístico de processos (CEP). Inclusive o próprio Deming chamava o ciclo de “ciclo de Shewhart”.
O modelo proposto por Shewhart era o Plan, Do, See (PDS. Em tradução, Planejar, fazer e observar), e baseava se na premissa de, primeiro planejar a atividade, fazê-la e então observar os resultados obtidos. Era um primeiro esboço de melhoria contínua, sendo muito importante para o Fordismo.
Mas não pense que Deming apenas tomou o ciclo pra si. Ele tem seu mérito na difusão da ferramenta não apenas por citá-la, mas por aprimorá-la, facilitando seu entendimento.
Deming desmembrou o See no que conhecemos hoje, Check e Act (Checar e agir), tornando o conceito mais fácil de ser assimilado. No antigo PDS estava implícito que após a observação algo deveria ser feito, senão, porque observar mesmo? Mas o PDCA reforça a importância da ação, deixando claro que o trabalho não termina no resultado.
Conceituando o ciclo PDCA
Uma característica importante do PDCA é sua simplicidade de aplicação. Seu conceito é muito básico, justamente porque é apoiado em etapas, cada uma delas muito clara. Vamos a elas:
Plan (Planejar)
Antes de tomar qualquer ação, deve ser realizado um planejamento do que será feito. O importante aqui não é olhar apenas para as atividades, mas sim seus objetivos. Um plano deve ser traçado olhando para onde se deseja chegar. Como em uma viagem, precisamos de um destino para saber qual caminho pegar.
Planejar não é apenas traçar a rota, mas sim entender as condições da estrada para fazer a melhor viagem. É prever cada parada para abastecer ou ir ao banheiro, o número de praças de pedágio e identificar os trechos mais perigosos.
E mais importante: Ter um prazo! Planejamentos bem feitos são pautados em metas, principalmente de tempo.
Saindo da estrada e vindo para a fábrica, não é planejamento revisar um equipamento qualquer dia. Não existe planejar-se para uma auditoria sem data limite para as atividades, afinal nada adianta tudo estar cumprido se a auditoria já passou. Também não adianta produzir todo o pedido se a entrega no cliente era na semana passada.
Planejar é prever e estruturar as melhores ações com base nas metas de desempenho e tempo.
Do (Fazer)
Hora de tirar a ideia do papel. O fazer é a etapa de mão na massa. É onde as equipes podem brilhar. A ação é a parte com a qual a maioria das pessoas se identifica. É natural, nós gostamos de fazer coisas. O fazer é a parte palpável do PDCA, aquela que demonstra que algo finalmente está sendo feito.
Voltando para a viagem, é hora de entrar no carro e dirigir confortável em direção ao horizonte (Espero que vocês gostem de dirigir.. rsrs). Fazer é colocar nossas habilidades práticas à prova.
Na indústria nós vivemos fazendo. Produzir é um ato do fazer. Consertar é fazer. Testar protótipos de produtos no P&D, vender produtos ou analisar matérias-primas é fazer. Não há muito segredo aqui. Esta é a etapa onde o resultado é construído.
Mas não é fazer qualquer coisa de qualquer jeito. Por isso o planejamento é importante. Ele direciona as atividades.
Check (Checar)
Com o resultado alcançado, é hora de olhar para tudo o que foi feito. Nesta etapa verificamos se o nosso plano rendeu aquilo que era esperado. Mas na realidade, checar apenas depois da ação não é bem o mais indicado.
Checar é um ato de observação, de coleta de dados. E existe momento melhor para observar algo do que durante a ação? Podemos até separar as etapas de checar e de fazer por ser didático, mas na verdade, estamos sempre checando o que está acontecendo.
Deixar para avaliar algo apenas pelo seu resultado final pode levar a uma série de erros de análise. E pior, podemos desperdiçar informações valiosas que estão no meio do processo.
Isso aqui não é Maquiavel onde os “fins justificam os meios” (Essa frase não é de Maquiavel, apesar de muitos creditarem a ele. Ainda assim, recomendo bastante a leitura de O príncipe).
Existem diversas formas de alcançar um resultado. Um exemplo fora da realidade: Você pode produzir um leite com acidez dentro do padrão tanto tratando o leite dentro das Boas Práticas de Fabricação como adicionando neutralizantes (daí a importância de saber estipular metas).
Os meios importam, e muito. Só podemos melhorar algo quando entendemos. E só podemos entender algo de verdade observando cada etapa do processo.
Act (Agir)
Chegamos na parte mais ignorada na hora de aplicar PDCA, mas justamente a que requer mais atenção. O agir aqui não é o mesmo da etapa de fazer. Nesta etapa estamos querendo atuar no processo depois dos resultados.
Eu diria que a melhor palavra para essa etapa seria Corrigir. Ou Melhorar! (Plan, Do, Check e Improve, PDCI. Agora esse é o ciclo de Paulo Henrique).
Isso porque o objetivo do agir é, depois de avaliar o que foi feito, buscar os pontos possíveis de otimizar e atuar neles. É corrigir as falhas, mas também manter e melhorar o que deu certo.
E esse é um ponto importante do PDCA. Se o objetivo é atingido, geralmente esquecemos desta última etapa. Afinal deu tudo certo!
Mas isso não é PDCA! É um plano de ação simples, bem executado, mas não é PDCA.
O PDCA é mais que um método correto de fazer alguma atividade. É uma ferramenta de melhoria contínua, onde cada próxima atividade será melhor que a anterior, justamente porque foram identificados os gargalos e se atuou neles.
Não se esqueça que é um CICLO
Embora seja um conceito simples de destrinchar, não é difícil encontrarmos o uso incorreto da ferramenta. Veja que em nossa rotina, nós fazemos várias das ações do PDCA de forma isolada.
Nós planejamos nosso dia logo pela manhã, embora não façamos nada do que foi estipulado (“Hoje eu vou na academia!” e não foi!).
Fazemos várias coisas por diversos motivos. Também vivemos observando o que acontece, memorizando e entendendo o mundo a nossa volta.
E melhoramos nossos hábitos, seja por nós ou por coisas que vemos os outros fazerem.
A mágica do PDCA e sua robustez está em unir essas etapas para trabalhar em conjunto. Só que, para dar certo de verdade, é necessário alimentar o ciclo.
As vezes nos esquecemos que o PDCA é um ciclo. O agir não é a última etapa. Ela é apenas o gatilho do próximo ciclo. Isso também quer dizer que ele não precisa começar no planejamento.
Você pode muito bem começar do Fazer ou mesmo do Checar. Desde que, após ver como tudo funcionou, você faça a avaliação e crie um plano para tentar novamente, corrigindo as falhas observadas.
A melhoria de verdade só pode ser alcançada se estivermos em constante análise do que está sendo feito e principalmente, como está sendo feito.
Simples não quer dizer fácil
É justamente no ciclo que mora a complexidade da ferramenta. Manter o ciclo funcionando é lindo na teoria, mas na prática sabemos que não é fácil. Isso porque sempre que você melhora algo, a próxima melhoria tende a ser mais difícil.
O corte de custos e desperdícios, por exemplo. Vamos supor que cada rodada do ciclo remova 80% das perdas. Se começamos com 1000 unidades fora, no primeiro ciclo, vamos conseguir recuperar 800 delas. Um impacto enorme.
Já no segundo ciclo, vamos conseguir recuperar 160, que ainda é um bom resultado, mas no terceiro ciclo, serão apenas 32 unidades recuperadas. Percebe que o esforço está se tornando grande demais para recuperar cada vez menos, do ponto de vista absoluto?
Bom senso é sempre importante para avaliar as situações. Não podemos ficar gastando nosso tempo (que também é dinheiro) em resultados inexpressivos só para ter um processo perfeito.
Contudo, isso também pode ser uma armadilha, que inclusive acontece comigo: Encerrar o ciclo antes da hora por achar que já alcançou o ponto onde o esforço é maior que a recompensa.
É de nós seres humanos. Adoramos uma zona de conforto. Mas na grande maioria das vezes, dá para fazer um pouco mais. Como? Se mantendo no ciclo, mudando a abordagem ou o foco dos objetivos. É nessas horas que encontramos um novo gargalo, e fôlego para uma nova rodada.
Mesmo sendo uma ferramenta básica, há ainda muitos assuntos para serem explorados. Mas esses ficam para um outro artigo.